domingo, 27 de maio de 2018




(para a Lídia Jorge)

inesperadamente
um livro apenas
salta da estante e
volteja como um raio
de sol em torno de mim

um sorriso qua andava
algures num passado
longínquo
brilhou nos meus olhos
reconfortados

terça-feira, 22 de maio de 2018




frágeis são as palavras
impotentes
para dizer o desejo
que palpita no sujeito
divorciado da
realidade de pedra.

resta apenas a poesia.

sábado, 19 de maio de 2018




estranha-se a face rugosa
da epiderme como
folha branca caduca
a contar os dias que passam
como chuva escorregando
janela abaixo indiferente
à perfeição das cortinas
rendadas

quinta-feira, 17 de maio de 2018





nem todos os dias são
de usar letras para exprimir
qualquer emoção
mas todos os dias
há uma emoção pelo menos
que sobressalta o sono
e fica muda

segunda-feira, 14 de maio de 2018




entre o calendário
e o tempo sentido
existe uma fissura que
se vai alargando
à medida que os dias
se enrolam uns
atrás de outros

lá no fundo surgem
matérias inflamáveis
que é preferível
ignorar

quinta-feira, 10 de maio de 2018





este tempo corre
como jacto supersónico
e as pessoas correm
a querer acompanhá-lo
ansiosas de não saberem o quê
apenas embriagadas de
velocidade deixando
para trás os pedacinhos
de pedras que cobrem
a praia as cartas escritas
à mão as crianças brincando no
jardim as bicicletas
estacionadas na borda
do rio

no fim da viagem
a paragem é igual
para todos.

domingo, 6 de maio de 2018




primeiro foram os ossos
espalhados à entrada
de cansaço
agora é a pele
estranhadamente
rugosa e manchada
a denunciar
a acumulação de um tempo
que tardava a
reconhecer.

sexta-feira, 4 de maio de 2018




a ferida resiste
a bálsamos a iodo a saliva
às lágrimas até que
não caíram
ela esconde-se
por vezes
pode parecer
sarada
mas resiste
aqui
no centro do
coração
despedaçado.

terça-feira, 1 de maio de 2018





recomeçar a subir
lentamente
uma duas três
vezes quantas precisas
até ao cimo da montanha.

o rés-do-chão sufoca.